Pesquisa do Mestrado em Antropologia da UFPB recebe menção honrosa em Concurso

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A dissertação “Arte é para todos” do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal da Paraíba (PPGA/UFPB) recebeu, entre 48 trabalhos inscritos de universidades do Brasil, a terceira menção honrosa do Concurso Sílvio Romero 2016.

 

Escrita por Darllan Neves da Rocha, o trabalho trata de uma pesquisa desenvolvida por ele, quando mestrando do PPGA/UFPB, nos anos 2013/2014, abordando como a tradição dos artesãos do Alto do Moura, na cidade de Caruaru (PE), é construída e utilizada para demarcar distinções sociais do grupo e seus integrantes.

 

Como resultado da dissertação, Darllan Rocha produziu um filme de 36 minutos que revela a realidade cultural iniciada pelo Mestre Vitalino, passando por Mestre Galdino até aos artesãos e às artesãs atuais, dando sustentação ao saber fazer bonecos em barro e ao seu valor patrimonial.

 

O Concurso de Monografias Sílvio Romero foi instituído em 1959 e atualmente está ligado ao Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular (CNFCP) em parceria com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Ao longo dos seus 58 anos, o prêmio espelha as mudanças teóricas e metodológicas no campo de estudos das culturas populares e ainda acompanha a institucionalização desses estudos nas universidades, nas áreas de antropologia, história, literatura e etnomusicologia no país.

 

Nesta entrevista concedida à Agência de Notícias da UFPB, Darllan Rocha, fala da relação da arte com a Antropologia e onde foi feito todo o trabalho de filmagens e edição do seu documentário.

 

AgN/UFPB: Quais são os objetivos da sua pesquisa que originou a dissertação “Arte é para todos”?

 

Darllan Rocha: Investigar como a tradição dos artesãos e artesãs do Alto do Moura, em Caruaru/PE, é construída e demarca distinções sociais do grupo, entre os próprios integrantes, sob diferentes aspectos, e enquanto elemento instrumental para sua visibilidade externa, a partir da qual é demonstrada como Patrimônio Cultural, considerando tanto as práticas elaboradas por instituições públicas e privadas, como as estratégias acionadas pela comunidade artesã e sua elaboração.

 

É na disputa da tradição que se revela as distinções dos posicionamentos sociais pelos artesãos e evidenciam a existência de uma hierarquia social através de categorias próprias, como a distinção social entre ser Artista, ser Mestre e ser Artesão. Desse modo, Tradição é o elemento definidor que diferencia os que a mantêm e os que a modificam, distinção interna à comunidade, que se organiza em grupos domésticos, demarcando a identidade e a relação com o lugar.

 

AgN/UFPB: Como resultado da sua pesquisa foi elaborado um  documentário relacionado ao tema, o que retrata esse filme?

 

Darllan Rocha: O filme dura cerca de 36 minutos e revela uma realidade cultural sobre a arte figurativa iniciada com Mestre Vitalino, passando por Mestre Galdino até os artesãos e artesãs atuais. Nessa produção a memória social possibilita adentrar diversos aspectos sociais a partir da petit história, descrevendo o tempo etnográfico e possibilitando elaborar estratégias para ações futuras. O fio condutor do discurso do filme é a tradição do saber fazer bonecos em barro e seu valor patrimonial que são os temas centrais para compreensão de como esse conhecimento é transacionado.

 

AgN/UFPB: Como e onde foi feito todo o trabalho de filmagens e edição do seu documentário?

 

Darllan Rocha: Resultado de extensa pesquisa, desde 2008, a produção fílmica foi realizada entre 2013 e 2014. No primeiro ano, juntamente com minha companheira Illian Narayama, captamos as imagens, depoimentos e áudios do lugar etnográfico. Com o material captado e finalizada a dissertação, em 2014, consegui me dedicar ao trabalho de decupagem do material à finalização, cuja escrita do trabalho fundamentou o roteiro e a construção semiótica.

 

As etapas da produção se iniciaram pelo Núcleo de Produção Digital (NPD-PB/UFPB) transformado na Unidade de Produção Audiovisual (UPA/UFPB), cujos materiais de captação e edição foram disponibilizados e viabilizados para realização do filme.

 

Na fase de edição, foram várias cabeças e mãos que se envolveram com o trabalho, como a coorientação de João Mendonça, enquanto outras pessoas se envolveram, apenas, por acreditarem nas imagens captadas: Arthur Lins, Nina Flor, Uadi Nóbrega, Ester Florêncio, Léo Gonçalves e, posteriormente, CH Malbes. Em relação a esta equipe, durante a finalização do filme, se iniciou parcerias e amizades.

 

AgN/UFPB: O que representa para você o fato do seu trabalho ser contemplado com menção honrosa do Concurso Sílvio Romero 2016 sobre Folclore e Cultura Popular?

 

Darllan Rocha: Satisfação, esta palavra representa o sentimento que me tomou desde o momento que recebi o resultado. Afinal, este é um dos poucos e mais importantes prêmios da área acerca de estudos culturais, cujo termo é problematizado, mas assim se denomina, como Folclore e Cultura Popular, cuja nova edição do Concurso Sílvio Romero 2017 está aberta para inscrições no site do Centro Nacional do Folclore e Cultura Popular do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

 

É concorrido por pesquisadores de diversos níveis de formação e avaliado por comissão composta com especialistas do campo temático e de diversas áreas do conhecimento, inclusive da Antropologia. Ou seja, é um reconhecimento dos universos acadêmico/científico, na área da Antropologia e no campo do Patrimônio Cultural.

 

AgN/UFPB: Quando e como se deram a apresentação e defesa do seu trabalho? Quem orientou seu trabalho de pesquisa e quais os demais professores que funcionaram na banca examinadora e de aprovação?

 

Darllan Rocha: O trabalho escrito e fílmico foi apresentado e avaliado em três momentos e espaços diferentes, proporcionando um processo de construção, amadurecimento e reconhecimento fundamental para os trabalhos antropológicos e etnográficos.

 

A banca, ocorrida em 2014, foi composta pelo orientador Fabio Mura, o coorientador João Mendonça, ambos do Programa de Pós-Graduação em Antropologia (PPGA/UFPB) e pela examinadora interna Luciana Chianca (UFPB) e Sandro Salles da Universidade Federal da Paraíba (UFPE), oportunidade que ocorreu a defesa e exibição do documentário com a presença de integrantes da comunidade artesã do Alto do Moura através de Severino Vitalino, Marliete Rodrigues e Cícero José.

 

Com presença dessas pessoas do Alto do Moura, a defesa acarretou num evento do próprio PPGA/UFPB, pois no dia após a defesa realizamos uma oficina com os três artesãos que durou toda a manhã e com cobertura da TV UFPB.  Após a finalização, levei-os para conhecer alguns importantes lugares de João Pessoa como a comunidade da Penha e a Estação Ciência, experiência que proporcionou contatos e convites para o retorno da comunidade para João Pessoa para realização de outros eventos.

 

A defesa também ocorreu na própria comunidade durante a reunião da Associação dos Artesãos e Artesãs em Barro e Moradores do Alto do Moura (ABMAM), onde a avaliação e aprovação do grupo foi possível para propor e ser contemplado no Concurso Sílvio Romero 2016 e, brevemente, ser publicado.

 

AgN/UFPB: Qual o conceito de arte em antropologia?

 

Darllan Rocha: A Antropologia é a ciência que busca compreender a relação entre culturas, a cultura do “Eu”, enquanto grupo que pertenço e compartilho a forma de ser e conceber o mundo; e a cultura do “Outro”, como pessoas que vivem diferente de mim por outros processos de vida e experiências. Assim, essa busca incessante de compreensão do outro pela Antropologia é compartilhada com a Arte através do exercício contínuo da Alteridade.

 

Desde os primeiros contatos com povos e culturas diferentes, primórdios do que viria a ser a Antropologia, a preocupação e relações com artefatos, criações, adornos foram estabelecidos como tema importante para os antropólogos. Mas cada período da história da Antropologia foram desenvolvidos métodos e perspectivas distintas e cumulativas sobre a relação entre humanos e a arte.

 

Das primeiras perspectivas está ligada aos evolucionistas e sua paixão por adornos cuja Arte era considerada como um campo de investigação, mas por apenas um caminho possível de desenvolvimento, logo, a Arte desenvolvida pela própria cultura dos escritores evolucionistas seria a mais desenvolvida e as demais estariam em etapas inferiores de complexidade.

 

Superando esta perspectiva, vários antropólogos vêm desenvolvendo teorias e perspectivas diferentes, mas que todas superam a ideia evolucionista, como vertente colonizadora, etnocêntrica e superada, assim, à antropologia não importa compreender o Humano e Arte, mas sim, os humanos e as artes. Assim, Franz Boas propaga o difusionismo americano, a partir do particularismo histórico, e escreve um dos principais livros para quem se interessa pela área, o livro Arte Primitiva, com estudos e descrições de várias culturas americanas. Posteriormente, Alfred Gell desenvolve a perspectiva de Arte e Agência, demonstrando a arte como modo de ação.

 

O antropólogo Clifford Geertz também contribui com a definição de Arte como Sistema Cultural, criticando determinadas heranças evolucionistas sobre as leituras da arte de culturas distintas. Ainda, posso citar Arjun Appadurai com seu livro Vida Social das Coisas; ou Pierre Bourdieu com a Economia das Trocas Simbólicas, cuja economia simbólica e capital são problematizados em diálogo com a produção, difusão e conhecimentos da Arte. Recentemente, Tim Ingold propõe outra perspectiva de superação da análise sobre humanos e objetos ou animais, para uma perspectiva de compreensão entre Humanos e Não Humanos, saindo da ideia de objetos para a percepção de coisas que interagem e significam aos humanos.

 

Enfim, não pretendo esgotar ou levantar parte das discussões da arte na Antropologia, somente propus demonstrar como o conceito é polissêmico, cujas perspectivas são capazes de serem desenvolvidas simultaneamente no tempo, por pesquisadores e aportes teóricos distintos. Como percebemos recentes pesquisas em diálogo entre os campos da arte e da antropologia, como a performance, a cultura material, a técnica, o patrimônio cultural e a relação entre humanos e não humanos. Sem única definição, mas diversificação em perspectivas e métodos a Antropologia da Arte comporta a multiplicidade e simultaneidade científica. Antropologia e Arte são Alteridades. Arte é criação, Antropologia cria a relativização!

Fonte: 
Agência de Notícias da UFPB - Paulo César Cabral
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