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Canabinoides: Diferenciação, Mecanismos e Aplicações Terapêuticas.

por Coordenação publicado 02/09/2024 23h48, última modificação 02/09/2024 23h49
Os canabinoides são compostos químicos encontrados especialmente na planta Cannabis sativa, conhecidos por sua ampla gama de aplicações terapêuticas, interagindo de forma majoritária com o sistema endocanabinoide. Existem mais de 100 canabinóides diferentes, mas os mais estudados e utilizados terapeuticamente são o tetrahidrocanabinol (THC) e o canabidiol (CBD). O sistema endocanabinoide é uma rede complexa e essencial para a regulação de diversas funções no corpo humano. Além dos conhecidos receptores canabinoides (CB1 e CB2), esse sistema envolve uma variedade de outros receptores e canais, como os TRPV1, conhecidos como receptores vaniloides, e os PPAR (receptores ativados por proliferador de peroxissoma). Cada um desses componentes desempenham papéis específicos em processos fisiológicos importantes. Os receptores CB1 são receptores acoplados à proteína G (GPCR), são predominantemente encontrados no sistema nervoso central, com mais expressão nos gânglios da base, cerebelo e hipocampo, onde influenciam a percepção da dor, o humor e a memória, enquanto os CB2 estão mais associados ao sistema imunológico e à modulação da inflamação. Já os receptores TRPV1 estão envolvidos na detecção e regulação da temperatura corporal e da dor, sendo cruciais em respostas inflamatórias. Os receptores PPAR, por sua vez, desempenham um papel significativo no metabolismo lipídico e na neuroproteção. Em conjunto, os componentes do sistema endocanabinoide contribuem para a homeostase do organismo, regulando desde a resposta à dor até o equilíbrio energético, o que torna esse sistema vital para a saúde geral. Os canabinoides, por sua vez, podem ser classificados em três categorias principais: fitoterápicos, endógenos e sintéticos. Cada um desses tipos possui diferentes origens e mecanismos de ação no corpo humano. A seguir, serão descritas as principais diferenças entre eles em relação à origem e forma de atuação no organismo: Canabinoides Fitoterápicos (Fitocanabinoides) Os canabinoides fitoterápicos, ou fitocanabinoides, são compostos naturalmente presentes na planta Cannabis sativa. Os mais conhecidos são o tetrahidrocanabinol (THC) e o canabidiol (CBD), mas existem muitos outros, como o canabigerol (CBG) e o canabicromeno (CBC). Os fitocanabinoides interagem principalmente com o sistema endocanabinoide humano, ligando-se aos receptores canabinoides CB1 (localizados predominantemente no sistema nervoso central) e CB2 (encontrados principalmente no sistema imunológico). Os principais representantes e suas atuações: THC - Atua como agonista parcial dos receptores CB1 e CB2, presentes tanto nos neurônios GABAérgicos inibitórios quanto nos neurônios glutamatérgicos excitatórios, causando efeitos psicoativos e anti-inflamatórios. CBD - Não se liga diretamente aos receptores CB1 e CB2, mas modula sua atividade indiretamente e também interage com outros receptores, como os de serotonina (5-HT1A) e vanilóides (TRPV1), influenciando a dor, ansiedade e inflamação, ele é um produto químico não psicotrópico, com isso, o CBD vem apresentando grande potencial para tratamento de distúrbios médicos como epilepsia. Canabinoides Endógenos (Endocanabinoides) Os endocanabinoides são produzidos naturalmente pelo corpo humano, conforme necessário para regular processos fisiológicos.. Os dois principais endocanabinoides identificados são a anandamida (AEA) e o 2-araquidonoilglicerol (2-AG). Estes compostos endógenos se ligam aos receptores CB1 e CB2 de maneira semelhante aos fitocanabinoides. Ao contrário dos neurotransmissores clássicos, os endocanabinoides são sintetizados sob demanda e rapidamente degradados por enzimas como a FAAH (que degrada a anandamida) e a MAGL (que degrada o 2-AG). Os principais representantes e suas atuações: AEA - Tem uma afinidade mais alta pelos receptores CB1, o que está relacionado à regulação do humor, dor e apetite. 2-AG - Atua tanto em CB1 quanto em CB2, desempenhando um papel crucial na modulação da inflamação e na resposta imune. Canabinoides Sintéticos Os canabinoides sintéticos são produzidos em laboratório e projetados para imitar ou modificar a ação dos canabinoides naturais. Alguns exemplos são o dronabinol (uma forma sintética de THC) e o nabilona (um análogo do THC). Muitos canabinoides sintéticos se ligam aos receptores CB1 e CB2, mas podem fazê-lo de forma mais potente e específica do que os fitocanabinoides. Os principais representantes e suas atuações: Dronabinol - Atua como agonista dos receptores CB1, replicando os efeitos do THC, sendo usado para tratar náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia e perda de apetite. Nabilona - Também é um agonista dos receptores CB1, utilizado no tratamento de náuseas, mas com uma ação farmacológica mais controlada e previsível. K2/Spice - Exemplos de canabinoides sintéticos recreativos são o K2 e Spice, que se ligam fortemente aos receptores CB1, muitas vezes resultando em efeitos colaterais graves e imprevisíveis devido à sua alta potência e falta de controle na formulação. De um modo geral, todos os três tipos interagem com os receptores CB1 e CB2, mas os sintéticos podem ser mais potentes e específicos, visto que, são projetados para ter afinidades e ações direcionadas a estes receptores. Essas diferenças descritas têm implicações importantes no uso terapêutico e nos efeitos adversos de cada tipo de canabinoide. Enquanto os fitocanabinoides e endocanabinoides tendem a ter um perfil de segurança mais conhecido, os sintéticos podem variar amplamente em potência e segurança. Abaixo, discutimos os principais tipos de canabinoides estudados atualmente e suas aplicações terapêuticas, além do mecanismo de ação pelo qual eles atuam: 1. Tetrahidrocanabinol (THC) Mecanismo de ação: O THC é o principal composto psicoativo da cannabis. Ele atua principalmente nos receptores canabinoides CB1, que estão concentrados no sistema nervoso central. A ativação desses receptores resulta em efeitos psicoativos, como euforia e alteração da percepção sensorial. Além disso, o THC também se liga aos receptores CB2, presentes no sistema imunológico, contribuindo para seus efeitos anti-inflamatórios. Aplicações terapêuticas: Analgesia: O THC é eficaz no alívio da dor crônica, especialmente em condições como esclerose múltipla e neuropatia. Náuseas e vômitos: O THC é utilizado no tratamento de náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia. Aumento do apetite: Usado em pacientes com HIV/AIDS ou câncer para estimular o apetite e prevenir perda de peso. Espasticidade Muscular: É usado no controle de espasmos musculares em pacientes com esclerose múltipla. 2. Canabidiol (CBD) Mecanismo de ação: Ao contrário do THC, o CBD não é psicoativo. Seu mecanismo de ação é mais complexo, envolvendo a modulação indireta dos receptores canabinoides. O CBD não se liga diretamente aos receptores CB1 e CB2, mas influencia seu funcionamento, além de interagir com outros sistemas, como os receptores de serotonina (5-HT1A) e receptores vaniloides (TRPV1), que estão envolvidos na regulação da dor, ansiedade e inflamação. Aplicações terapêuticas: Ansiedade e Depressão: O CBD tem sido estudado como um tratamento potencial para transtornos de ansiedade e depressão, com resultados promissores. Epilepsia: É utilizado em medicamentos para tratar formas severas de epilepsia, como a síndrome de Dravet e Lennox-Gastaut, que são resistentes a outros tratamentos. Dor Crônica e Inflamação: Possui propriedades analgésicas e anti-inflamatórias, sendo eficaz no tratamento de condições como artrite e dor neuropática. Neuroproteção: Estudos indicam que o CBD pode ter efeitos neuroprotetores, o que pode ser benéfico em doenças neurodegenerativas como Alzheimer e Parkinson. 3. Canabigerol (CBG) Mecanismo de ação: O CBG é o precursor de outros canabinoides, como THC e CBD. Ele interage com os receptores CB1 e CB2, mas de maneira menos potente que o THC. Contrariamente ao CBD e ao THC, o CBG apresenta antagonismo ao receptor 5HT1. Além disso, ele também age como antagonista dos receptores α2-adrenérgicos, o que pode contribuir para seus efeitos analgésicos e anti-hipertensivos. Aplicações terapêuticas: Glaucoma: O CBG pode reduzir a pressão intraocular, sendo estudado no tratamento do glaucoma, ainda com baixas evidências. Doenças inflamatórias intestinais: Seu potencial anti-inflamatório está sendo investigado em doenças como a colite. Neuroproteção: O CBG tem mostrado efeitos neuroprotetores, sendo estudado em doenças como Huntington. Propriedades Antibacterianas: O CBG tem mostrado potencial como agente antibacteriano, especialmente contra cepas resistentes de bactérias. Alívio da Dor: O CBG pode atuar como um analgésico natural, ajudando a aliviar a dor sem os efeitos psicoativos associados ao THC. Isso o torna uma opção promissora para o tratamento da dor crônica. Modulação da pressão arterial: Há indícios de que o CBG pode ter ação anti-hipertensiva, embora essa área ainda esteja em fase de pesquisa inicial e os mecanismos exatos não sejam totalmente compreendidos. 4. Canabinol (CBN) Mecanismo de ação: O CBN é um produto da degradação do THC e tem uma afinidade relativamente baixa pelos receptores CB1 e CB2. Ele age como um agonista parcial nestes receptores, contribuindo para seus efeitos sedativos e anti-inflamatórios. Aplicações terapêuticas: Indução do sono: O CBN é conhecido por seus efeitos sedativos e é usado para melhorar a qualidade do sono. Alívio da dor: Possui propriedades analgésicas, especialmente quando combinado com outros canabinóides. Anti-inflamatório: Assim como outros canabinoides, o CBN também pode ter efeitos anti-inflamatórios, embora mais pesquisas sejam necessárias. 5. Tetrahidrocanabivarina (THCV) Mecanismo de ação: A THCV tem uma estrutura química semelhante ao THC, mas atua de maneira diferente nos receptores canabinoides. Em baixas doses, a THCV age como um antagonista dos receptores CB1, bloqueando os efeitos do THC. Em doses mais altas, pode ativar esses receptores, gerando efeitos semelhantes ao THC. Aplicações terapêuticas: Controle de peso: A THCV pode reduzir o apetite, sendo investigada no tratamento da obesidade. Diabetes: Estudos indicam que a THCV pode ajudar a regular os níveis de açúcar no sangue e melhorar a sensibilidade à insulina. Distúrbios neurológicos: A THCV tem potencial neuroprotetor e está sendo estudada em condições como a doença de Parkinson. Ademais, um conceito fundamental frequentemente abordado em estudos sobre a cannabis é o "efeito entourage". Esse termo descreve a interação sinérgica entre os diversos compostos presentes na planta, incluindo canabinoides, terpenos e flavonoides. Ao trabalhar em conjunto, esses compostos podem amplificar os efeitos terapêuticos, criando um impacto mais robusto no tratamento de diversas condições de saúde. O "efeito entourage" sugere que o uso de extratos da planta inteira pode ser mais eficaz do que a administração de canabinoides isolados, como o THC ou o CBD, sozinhos. Isso ocorre porque os outros compostos presentes na planta podem influenciar e aprimorar a ação dos canabinoides, proporcionando uma resposta terapêutica mais completa e equilibrada. Essa sinergia é vista como uma das principais vantagens dos extratos de espectro completo em relação aos compostos isolados, oferecendo uma abordagem mais natural e abrangente para o uso medicinal da cannabis. Considerações Finais Os canabinoides revelam um vasto potencial terapêutico e estão sendo cada vez mais explorados pela ciência médica devido às suas promissoras aplicações em diversas condições de saúde. Estudos recentes destacam suas propriedades benéficas no tratamento de doenças como dor crônica, epilepsia, ansiedade e distúrbios do sono, evidenciando sua importância no desenvolvimento de novas opções terapêuticas. No entanto, é fundamental que o uso desses compostos seja realizado sob a supervisão de profissionais de saúde qualificados. Isso se deve ao fato de que canabinoides podem apresentar efeitos adversos e interações com outros medicamentos, o que demanda um acompanhamento cuidadoso para garantir a segurança e a eficácia do tratamento. Além disso, a legalidade e regulamentação dos produtos derivados de canabinoides variam significativamente de uma região para outra. Portanto, é essencial que pacientes e profissionais estejam bem informados sobre as leis e regulamentos locais para garantir o uso adequado e legal desses produtos. À medida que a pesquisa sobre canabinoides avança, o horizonte para terapias baseadas em cannabis se torna cada vez mais promissor. Espera-se que novas descobertas e desenvolvimentos continuem a expandir as opções de tratamento, oferecendo alternativas valiosas para uma ampla gama de condições médicas e melhorando a qualidade de vida de muitos pacientes. Referências ARAÚJO, M.; ALMEIDA, M. B.; ARAÚJO, L. L. N.. The cannabinoids mechanism of action: an overview. BrJP, v. 6, p. 109–113, 2023. DOI: 10.5935/2595-0118.20230028-pt. Disponível em: https://www.scielo.br/j/brjp/a/DkrHzwvf9ngstvdd89KMHjk/abstract/?lang=pt#. Acesso em: 26 ago. 2024. BATHULA, P. P.; MACIVER, M. B. Cannabinoids in Treating Chemotherapy-Induced Nausea and Vomiting, Cancer-Associated Pain, and Tumor Growth. International Journal

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