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Quase 40 anos após assassinato, Margarida Alves continua símbolo de resistência
“Porque entendo que é melhor morrer na luta do que morrer de fome”, as palavras são do discurso de Margarida Maria Alves, na comemoração do 1º de maio de 1983, em Sapé. A líder sindical parecia antever que poucos meses após este discurso, os latifundiários da região tentariam calar sua voz.
A vida de Margarida foi interrompida brutalmente, em 12 de Agosto de 1983, por volta das 17 horas, com um tiro de espingarda que atingiu seu rosto. O crime aconteceu na porta de sua casa, em frente à sua família, em Alagoa Grande, no Brejo da Paraíba.
A motivação foi política. Margarida era uma imparável defensora dos direitos das trabalhadoras e trabalhadores agrários, durante os 12 anos em que esteve à frente da presidência do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande, lutou contra a violência no campo, pelo fim da exploração dos camponeses e pela reforma agrária.
38 anos após o assassinato, o nome de Margarida ainda ecoa como símbolo de luta que serve de inspiração para muitas outras mulheres. “Uma mulher camponesa sindicalista, uma grande liderança e uma pessoa que vivenciou importantes transições na igreja, no movimento sindical e eu diria também, a transição de deixar de ser uma mulher dona de casa, trabalhadora do campo, para ser uma mulher do espaço público político. Essa é Margarida Maria Alves”, define a historiadora Ana Paula Romão.
Legado
Ana Paula Romão é autora do livro “Margarida, Margaridas: Memória de Margarida Maria Alves (1933-1983) através das Práticas Educativas das Margaridas”, que conta a trajetória e o legado deixado pela paraibana. O trabalho é fruto da sua dissertação e está disponível para download. Para ela, a herança deixada pela líder sindical estende-se em pelo menos três dimensões. A primeira como mulher camponesa e sindicalista rural, o que não era comum para a época, sobretudo no Nordeste. Margarida Alves foi uma das fundadoras do Movimento Mulheres do Brejo, que articula as lutas das mulheres com as lutas do campo.
A segunda herança é a dimensão mais conhecida da paraibana, que é a luta pelos direitos trabalhistas dos trabalhadores rurais, como carteira assinada, décimo terceiro salário, jornada diária de trabalho de 8 horas e férias, direitos que já haviam sido conquistados pelo setor urbano. Assim como também influenciou no incentivo à educação política dos trabalhadores do campo, mais uma herança deixada por ela.
A sindicalista foi fundadora do Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural junto a Paulo Freire. No entanto, Ana Paula destaca principalmente o exemplo deixado por Margarida dentro da luta coletiva. “Trajetórias de mulheres à frente de espaços públicos tem muita representatividade para trabalhadoras rurais, então eu acho que o maior legado é o da memória da luta coletiva que a gente pode resumir na frase em que ela diz: ‘é melhor morrer na luta do que morrer de fome’ e isso ainda é muito atual”, defende a historiadora.
Marcha das Margaridas
Há 21 anos, mulheres de diversos movimentos sociais marcham até a capital federal em homenagem à memória da líder sindical e contra a pobreza, a fome e a violência sexista. "Margarida Maria Alves vive em cada uma de nós mulheres do campo, das florestas e das águas. Ela tem nos inspirado a continuar lutando, defendendo os nossos direitos e enfrentando todos esses desafios que temos no dia a dia”, expressa Mazé Morais, secretária de mulheres da Confederação Nacional dos Trabalhadores Agrários (CONTAG).
O movimento começou em 2000, com a participação de aproximadamente 20 mil mulheres. Desde então, a cada quatro anos, elas voltam a se reunir nas ruas de Brasília para cobrar políticas públicas voltadas às mulheres camponesas. A última edição, que ocorreu em 2019, contou com a participação de 100 mil mulheres de diversas regiões do país.
“Há 21 anos, a Marcha das Margaridas vem anunciando as bases de um desenvolvimento sustentável, a partir de relações justas e igualitárias pautadas nos valores da ética, da solidariedade, da reciprocidade e respeito à natureza. Margarida nos deixou esse grande exemplo de força, que nós continuamos honrando e nos inspirando”, finaliza Mazé.
Apesar da pandemia, as mulheres continuam em processo de construção e mobilização da sétima edição da Marcha das Margaridas que está prevista para agosto de 2023.
Extensionista: Aléssia Guedes | Edição: Lis Lemos