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Artistas espalham poemas em lambe-lambes por João Pessoa
Um muro de 40 metros foi coberto de lambe-lambes com poemas escritos por mulheres, localizado no bairro dos Expedicionários, em João Pessoa. Participaram da ação as escritoras Anna Apolinário e Aline Cardoso, organizadoras do Sarau Selvática. Elas também já espalharam os escritos por outros lugares da cidade, como o Centro Histórico, o bairro dos Bancários, no entorno da Praça da Paz e na UFPB.
Se antes silenciadas e rejeitadas, agora as palavras de mulheres passam a ocupar um espaço vital, movimentado e acessível aos olhos da população. A ação faz parte da coletiva Papel Mulher, originada no Rio de Janeiro, onde mulheres de todo o país e da América Latina espalham lambe-lambe com versos, frases ou diálogos de poetisas, escritoras e até mesmo políticas, como a vereadora carioca Marielle Franco, assassinada há três anos durante o seu mandato, registrando o discurso "não serei interrompida" pelas ruas do país.
O projeto foi uma ideia de Alexandra Maia, mestranda em Literatura pela UFF e coordenadora-geral da coletiva, que em uma disciplina sugeriu a ação com o objetivo de tornar escritos de mulheres latino-americanas mais acessíveis à população. Ela argumenta que a literatura fica muitas vezes presa a ambientes acadêmicos e escolares, e mesmo nesses espaços, é raro que a população tenha acesso a essas palavras.
"A literatura escrita por mulheres possui algo de muito revolucionário", diz Alexandra, explicando que o projeto aposta que os versos discutem assuntos silenciados por anos, como a violência contra mulher, lesbofobia e transfobia. "Poesia não é besteira, poesia pode ser um abraço, pode ser um grito, pode ser um tapa que a gente precisa", reflete a mestranda.
As ações da coletiva pelo país
Em fevereiro de 2020, ocorreu a primeira ação da coletiva pelo país, no Rio de Janeiro (RJ) e em Campina Grande (PB). Hoje, segundo a coordenadora, o projeto já reúne 160 mulheres no grupo de WhatsApp, o canal oficial para organização das colagens. As ações já aconteceram em mais de 25 cidades, em 12 estados de todas as regiões do país, e houve ações até na capital do México.
"Tem sido de arrepiar ver cada vez mais mulheres se somando, parece que todas estávamos sedentas por algo assim. É o que sinto e que sei que é compartilhado por muitas outras mulheres da coletiva", conta Alexandra.
As organizadoras realizam a curadoria de poemas, discursos e pensamentos de mulheres, fortalecendo a diversidade entre as escritoras, buscando sempre escritos de indígenas, negras, periféricas, pessoas com deficiência, de todas as regiões, que escrevem no presente ou no passado do Brasil.
A coletiva aposta na autonomia do projeto para espalhar as palavras por todo o país. Os lambe-lambes ficam disponíveis em pastas na internet para que todos tenham acesso e possam produzir as próprias colagens nas suas cidades. Para orientar as ações, foi criado um manual com o passo a passo que explica detalhadamente como distribuir as colagens.
As escritoras Anna Apolinário e Aline Cardoso definem a ação como um “intervenção urbana efêmera”, que precisa ser realizada de forma rápida, e resulta em uma disputa por narrativas da rua e uma espécie de revolução pelas palavras.
“Lamber as ruas com a poesia de mulheres é um ato revolucionário, um ato de transgressão e transformação de subjetividades, resistimos pela palavra poética, incessantemente construímos novos lugares de partilha e fortalecemos a luta por tornar o mundo um lugar mais humano e sensível, em que poesia e arte sejam signos de afeto, insubmissão e liberdade”, defende Anna Apolinário.
Para participar da ação e ter acesso aos lambes e ao manual de colagem, é necessário solicitar nas redes sociais da Papel Mulher (Instagram e Twitter) para ser incluída no grupo de WhatsApp. A coletiva também realiza reuniões mensais para instruir as novas integrantes interessadas em colar para que elas fiquem mais seguras durante a ação.
Extensionista: Grace Vasconcelos | Edição: Lis Lemos