Linguagem não-binária é alternativa para comunicação mais inclusiva

A luta de pessoas não-binárias e trans para serem representadas na sociedade tem levantado discussões sobre como a linguagem e o idioma padrão privilegiam o binarismo de gênero. O debate sobre uma linguagem não-binária, inclusiva ou neutra tem ganhado espaço, evidenciando o uso de expressões orais ou escritas que fujam da ideia dual de identidade de gênero.

“A linguagem não binária é uma tentativa de rever as normatividades de gênero nessa perspectiva de compreensão da não binariedade, que é uma visão histórica, colonial e imputada a nós ao longo dos séculos”, defende o professor Iran Melo, da Universidade Federal Rural de Pernambuco, que pesquisa as interfaces entre gênero, sexualidade e linguagem. 

Ele também afirma que pensar uma linguagem inclusiva questiona sobre como o idioma normativo ratifica o poderio masculino. Apesar do gênero feminino se enquadrar na binariedade, as mulheres são afetadas com o machismo presente na linguagem, que privilegia a masculinidade nas expressões. 

“A norma padrão, a língua como um todo, tem uma história de colonização. É uma língua edificada pelo poderio masculinista do homem branco e europeu. Por ter essa história, ela é marcada por uma exclusão e marginalização do feminino e da mulher”, sentencia. 

Linguagem e repressão identitária

O preconceito, a dificuldade de convivência e de comunicação são narrados por Mônis Barros, 24, estudante e pessoa não binária. Desde a adolescência ele não se sentia representado com o gênero feminino, as roupas e o comportamento que se esperava dele causavam desconforto e frustração. “Não me percebia enquanto mulher e foi muito doloroso para mim ter que usar roupas femininas que minha mãe e a expectativa da sociedade cisgênero queria”, desabafa. 

Mônis relata que na universidade enfrenta constrangimentos e muitas vezes é chamado pelo pronome “ela”, sofrendo assim com o desrespeito e incompreensão de sua identidade.  Ele acredita que a possibilidade do uso de uma linguagem neutra pode romper com o apagamento de pessoas não-binárias. “O uso do pronome neutro além de ser uma possibilidade de reparação e inclusão é também uma possibilidade de visibilizar pela linguagem a existência de pessoas que questionam o gênero”, reivindica.

Assim como Mônis, a ativista e coordenadora do Fórum de Mulheres em Luta da UFPB, Jade Vaccari, também acredita nas transformações que a linguagem neutra pode proporcionar para pessoas dissidentes.  “O sistema é opressor e a sociedade é conivente com os valores patriarcais, machistas e heteronormativos. Qualquer coisa que fuja dessa regra assusta e a reação é a repressão. O uso da linguagem não-binária representa uma das ações para que  a realidade mude. Imagina  em todos os lugares expressões como todes? Isso vai contribuir para propagar esses termos para toda sociedade”, acredita.

Uso da linguagem não-binária no cotidiano

O pesquisador Iran Melo explica como é propagada a ideia de que uma grande reformulação precisaria ser feita no idioma para incluir a linguagem-neutra e apresenta alternativas já existentes na língua portuguesa que podem fazer referência aos indivíduos no coletivo.

“Nossa língua já tem características da não-binariedade, há muitos recursos como substantivo sobrecomum e formas coletivas que nos ajudam a falar das pessoas sem marcar recursos da binaridade de gênero. Quando digo: o grupo de profissionais da educação sem dizer professoras e professores não estou em nenhum momento marcando o binarismo de gênero. Se eu faço isso é porque o nosso idioma já possui esse recurso”, defende. 

Extensionista: Crislaine Honório | Edição: Lis Lemos