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Mulheres enfrentam violência durante gestação e parto
"Na hora de fazer, você não chorou.” "Pare de gritar senão seu bebê vai morrer.” Frases violentas como essas são escutadas por mulheres que estão em trabalho de parto trazendo seus filhos ao mundo. Um momento esperado e celebrado pode ser de terror e sofrimento, graças a médicos e enfermeiras envolvidos no parto. Esses são alguns dos exemplos apontados pela professora do curso de Enfermagem da UFPB, Waglânia Freitas, pesquisadora da área.
Além das violências verbal e psicológica, a professora cita ainda que há uma banalização do uso da ocitocina pelo médicos. “A ocitocina é o sorinho que aumenta a dor, diminui o oxigênio do bebê, aumenta a contração uterina e expõe essa mulher a um risco de hemorragia no parto.” alerta.
Deixar a mulher de dieta, fazer lavagem intestinal e realizar toques contínuos também são violências a que as mulheres grávidas podem estar submetidas. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), apenas 15% das mulheres grávidas teriam a necessidade de realizar o parto cesariano, pois, entre outras consequências, esse método compromete a vida sexual dessas mulheres.
Mulheres negras
O racismo é um componente importante desse tipo de violência contra as mulheres. De acordo com pesquisa realizada pela Fundação Oswaldo Cruz, nos anos de 2011 e 2012, as mulheres negras têm quatro vezes mais chances de ter acompanhante negado.
A zootecnista Carolina Porto mãe de uma menina e integrante do Coletivo Pachamamá, que discute questões sobre a maternidade, conta que passou por violência obstétrica em diversas fases da sua gestação. No dia do seu parto, Carolina ouviu que não poderia entrar com nenhum acompanhante na sala de parto, pois só era permitida a presença da doula, profissional que orienta e assiste a mulher durante todo o período da gestação e parto.
No entanto, prevenida, ela levou impressa a Lei Municipal 13.080/2015 que determina a presença da doula e de outro acompanhante na sala de parto. Em âmbito nacional, com a Lei 11.108/2005, há a obrigatoriedade de os serviços de saúde permitirem um acompanhante junto à gestante no momento do parto.
Diversas violências
A pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz revela também que em procedimentos como a episiotomia, prática que envolve um corte cirúrgico feito na região da vagina, a chance da mulher negra não receber anestesia é 50% maior do que as demais.
A diarista Ericka Silva sofreu diversas formas de violência obstétrica nos partos de seus três filhos. Em nenhum deles, a mãe pode companhá-la. A mulher ainda sofreu duas episiotomias, realizadas nos partos do primeiro e do segundo filho.
“O médico também fez muita força com as mãos na minha barriga, dizendo que era para o menino descer. As enfermeiras sempre me diziam pra não gritar para não assustar as outras mães, mas a gente sente tanta dor que não aguenta”, relembra a mulher que tinha 18 anos na época. Hoje, aos 31, Ericka explica que não reconheceu aquilo como errado porque não tinha informação da existência da violência obstétrica.
Desinformação
Tanto a falta de informação, quando os diversos sentimentos no momento da gestação e do parto, impedem o reconhecimento dos atos violentos. Esse é o entendimento da jornalista Juliana Terra, que produziu o documentário “Meu parto, meu corpo, minhas regras” para sua monografia de conclusão de curso. No vídeo, Juliana, que é mãe de um filho e também integra o coletivo Pachamamá, registra os depoimentos de mulheres acerca das violências sofridas ao longo da gestação até o parto.
“Estar gestante te coloca numa situação de muitas incertezas. Fisicamente seu corpo muda, psicologicamente ocorrem muitas mudanças, emocionalmente, socialmente, muda tudo. Então é complicado as gestantes verem esses sinais de violência. A gente os percebe muitas vezes tempo depois", avalia a jornalista que também sofreu violência durante o parto.
A violência obstétrica pode ser denunciada na Ouvidoria do SUS, através do telefone 136, ou procurando o Ministério Público Federal.
Michelly Santos