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Projeto da UFPB promove acesso à saúde reprodutiva

publicado: 25/06/2020 19h05, última modificação: 25/06/2020 19h24

Nas últimas décadas, a taxa de fecundidade no Brasil tem apresentado uma queda significativa. Contudo, segundo a pesquisa  “Uso de contracepção e desigualdades do planejamento reprodutivo das mulheres brasileiras”, de 2018, esse dado é reflexo das mulheres com maior escolaridade e habitantes da zona urbana. A realidade, sobretudo no caso das mais jovens e pobres, continua sendo da gravidez não planejada e da privação a métodos contraceptivos.

Com o intuito de treinar profissionais da saúde e instruir as mulheres para garantir a aplicação segura do método contraceptivo, surgiu, em 2016, o “DIU na Atenção Básica” da UFPB. O projeto conta com três ações de extensão, sendo elas: “DIU na Atenção Básica: treinamento e ações educativas”, “Ampliação da oferta do DIU na capacitação de enfermeiros de Unidades Básicas de Saúde” e “Interiorização do DIU na Paraíba”. A partir dessas iniciativas, há uma atuação em conjunto nas redes de atenção básica do estado da Paraíba.

De acordo com a pesquisa “Uso de contracepção e desigualdades do planejamento reprodutivo das mulheres brasileiras”, o DIU é o método contraceptivo menos utilizado entre as mulheres, sendo mais predominante entre aquelas com maior escolaridade.

De acordo com o projeto, a dificuldade de implementação do Dispositivo Intrauterino (DIU) na rede pública tem início com os próprios profissionais da saúde que desconhecem o método de aplicação, mesmo sendo um procedimento que pode ser realizado por médicos da família e enfermeiros capacitados. Por essa razão, muitas unidades de saúde possuíam os kits básicos fornecidos pelo Ministério da Saúde, mas havia a ausência de trabalhadores instruídos.

Para minimizar esse cenário, o projeto realiza formações com estudantes dos cursos de Enfermagem e Medicina da UFPB e também com profissionais já atuantes na rede de saúde. O destaque está na instrução voltada para o respeito e autonomia das mulheres. Após essa etapa, há a busca pelas mulheres interessadas em implantar o dispositivo e o início de rodas de diálogo para que sejam tiradas dúvidas sobre o processo.

“Nesse momento, fazemos um bate-papo no sentido da mulher entender que é o corpo dela, que ela que tem que decidir se quer ou não colocar um corpo estranho no corpo dela, que existem benefícios e que existe risco. Não estamos ali só para inserir, mas para escutar e discutir a melhor possibilidade”, relata Dannyela Barrêto coordenadora do projeto “DIU na Atenção Básica”.

De acordo com um levantamento da BBC Brasil, as mulheres do Norte e Nordeste são as que possuem maior dificuldade de acesso a métodos contraceptivos por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), sendo também as que possuem o menor acesso ao DIU. Como explica a médica, além da dificuldade de encontrar profissionais aptos a realizar a inserção, o dispositivo é permeado de mitos que fazem com que as mulheres tenham medo.

“A mulher tem o direito de saber as complicações do método e desistir até por conta disso. Ela tem que saber que existe a possibilidade de perfurar o útero, de ter uma infecção, e elas tem que tomar a decisão com base em um contexto real, da consciência do corpo. Medos e mitos de que é abortivo, de que pode dar infertilidade também perpassam os profissionais da saúde. Não inserimos [o DIU] enquanto as mulheres não tirarem todas as dúvidas”, assegura Dannyela.

Nos espaços em que os projetos atuaram, a inserção do DIU aponta não só para um melhor planejamento familiar, mas também para o bem-estar da mulher. O perfil dessas mulheres atendidas é, em sua maioria, de donas de casa, de baixo nível educacional, pobres e com filhos. Elas estão, na maior parte das vezes, inseridas em um processo de retirada de sua autonomia quanto ao próprio processo reprodutivo.

“Entendemos a importância do DIU com relação ao contexto das mulheres de não deixá-las vulneráveis à pressão masculina, às vezes até em um processo violento. O homem quer ter a relação, diz que quer ter filho e depois abandona a mulher, deixando ela sozinha para cuidar do filho”, afirma a médica Dannyela Barrêto.

Lembro de uma mulher que atendi que tinha uma relação sexual tensa, porque ela não queria ter filho, mas o marido queria e não queria que ela usasse nenhuma contracepção. Ela colocou o DIU escondida dele, porque não aguentava mais o medo de engravidar, porque não era o que ela queria

Durante o período de isolamento social em consequência da pandemia de Covid-19, o projeto tem reavaliado a sua atuação e pensa em alcançar outras mulheres através das redes sociais. “Podemos conseguir ampliar o debate da sexualidade, que ainda é frágil. Também chegar no público mais novo, que não teve filho ainda”, conta a médica. Segundo ela, o DIU pode ser um método para as mulheres que querem se livrar dos efeitos hormonais dos anticoncepcionais e também permite que elas decidam o momento em que quiser retirar.

As ações desenvolvidas pela UFPB têm sido pioneiras, visto que, desde 2016, o país tem apresentado um retrocesso na atenção a políticas públicas de saúde sexual e reprodutiva. Além disso, o Brasil não é signatário no documento da Organização Mundial da Saúde de 2019 que firma compromissos acerca de questões reprodutivas das mulheres.

O “DIU na Atenção Básica” é um projeto de rede interdisciplinar para a formação de residentes em Saúde da Família e discentes do curso de Medicina e Enfermagem da UFPB. Algumas ações já foram realizadas nos municípios paraibanos de Sapé, Caaporã e Conde. A atuação também acontece em parceria com projetos do Ambulatório de Ginecologia-Obstetrícia do HULW, amparando as mulheres no pós-parto.

 

Ana Lívia Macêdo | Edição Lis Lemos