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Músico deve trabalhar mentalidade empreendedora, defende professor sueco na UFPB

Durante curso, Jan Sparby estimula habilidades para jovens músicos criarem negócios
publicado: 03/12/2019 19h21, última modificação: 03/12/2019 19h23
Formação é resultado de parceria com a Örebro University (Suécia). Crédito: Divulgação

Formação é resultado de parceria com a Örebro University (Suécia). Crédito: Divulgação

A Universidade Federal da Paraíba (UFPB), por meio do Departamento de Música, iniciou uma parceria com a Örebro University (Suécia), a fim de que a instituição europeia financie projetos por meio do Programa Linnaeus-Palme, junto à Escola de Música da Örebro, na Suécia.

O subsídio custeia passagem e estadia de estudantes e de professores durante intercâmbio.  São três alunos de cada uma das instituições por ano, por um período de um a dois semestres, e dois docentes anualmente, por um período de três a dez semanas.

O professor e compositor Jan Sparby é o primeiro docente da universidade sueca que veio ministrar aulas na UFPB. Ele trabalha como docente no Ensino Superior de Música desde 2006. No Brasil, já lecionou na Universidade de Música do Instituto Villa-Lobos, UniRio.

Em entrevista à Assessoria de Comunicação Social (Ascom) da UFPB, Jan revela suas experiências, descobertas da música popular brasileira, os diálogos com o cancioneiro folclórico sueco e como artistas podem desenvolver a cultura do empreendedorismo. Confira abaixo:

Ascom/UFPB: Como você avalia a atual situação da música instrumental no Brasil e em outros países do mundo? 

Jan Sparby: Infelizmente, não posso dar uma resposta detalhada a esta pergunta. Ainda conheço muito pouco sobre a música instrumental no Brasil, apenas a de Villa-Lobos e algumas obras de Camargo Guarnieri.

Mas não conheço nenhum dos compositores brasileiros contemporâneos. Sim, mas é claro que estou curioso; eu sei que existem alguns que exploram a linguagem contemporânea na UFPB e estou ansioso para conhecer o trabalho deles.

Pelo que entendo, a UFPB – assim como a UniRio – desenvolve trabalho a partir da tradição da música clássica e, paralelamente, atividades com a linguagem contemporânea. Assisti aos concertos no Festival Internacional de Música Clássica – que acontece esta semana e onde pude ouvir a desempenho de professores da UFPB – atesta um nível bastante sólido e profissional.

Ascom/UFPB: Parcerias internacionais como UFPB-Örebro University podem contribuir em quais aspectos para este cenário musical? 

Jan Sparby: Espontaneamente, eu gostaria de discutir vários assuntos dentro desta cooperação acadêmica. No que diz respeito à música instrumental, eu gostaria de equilibrar nossa visão das tradições musicais ocidentais; podemos tocar a mesma música, mas como a interpretamos e a tocamos?  Como a música contemporânea brasileira difere da sueca e, não menos importante, como nossa herança cultural e nossa música folclórica influenciaram a música contemporânea em nossos países?

Não devemos esquecer a música popular; quais são as diferenças e semelhanças entre o Brasil e a Suécia? E, novamente, como nossa herança cultural e nossa música folclórica influenciaram a música popular? Na Suécia, estamos focando muito no empreendedorismo artístico e esse é um assunto que também devemos discutir. Na verdade, tem muito mais a ver com música do que a maioria das pessoas pensa.

Gostaria também de acrescentar a importância em se abordar todas essas questões junto aos alunos; tanto os estudantes suecos quanto os brasileiros devem ter a oportunidade de crescimento a partir disso; através de nossos encontros musicais – a partir do curso que estou aqui ministrando – e os resultados dessas questões interessantes, compartilhando ideias sobre como estender a experiência de tocar música clássica.

Enquanto falamos, gostaria de enfatizar minha impressão sobre o livro “Interseções: Diálogos interartísticos em torno da musica”, onde os artistas relacionam poemas e pinturas que refletem as músicas que são apresentadas nos concertos. Em um deles, inclusive, uma atriz faz leituras de poemas antecedendo a apresentação. Em minha opinião, essas são excelentes ideias sobre como combinar diferentes concepções estéticas.

Ascom/UFPB: Quais as aproximações e rupturas da música atual, por exemplo, se pensarmos em compositores como Stravinsky, Pierre Boulez e John Cage?

Jan Sparby: Se agora posso responder a essa pergunta sob a perspectiva da música popular, há muitas coisas a serem ditas. Quando se trata de música pop, os métodos e técnicas para compor músicas são bem diferentes. É claro que existem algumas características comuns, mas parâmetros musicais como forma, melodia, harmonia, padrões de ritmo, quantidade de partes etc. são bastante simplificados em comparação aos compositores que você está mencionando.

Eu te dou dois exemplos: em geral, a harmonia na música pop tende a manter-se na música tonal, incluindo o uso da música modal. Em músicas pop de grande sucesso, o uso (excessivo) de acordes diatônicos, modos maior ou menor, também é comum, e minimizar a quantidade de acordes em até quatro tem sido quase que um padrão.

Por outro lado, quanto ao uso de diferentes modos – como empregado na obra Danse de la fureur pour les sept trompetes, de Olivier Messiaen – verificamos que existem muitos compositores na música pop que escolhem um determinado modo para refletir a mensagem da música. A exemplo de Uptown Funk (Ranson/Mars) que se utiliza do modo da escala dórica; e Venus As A Boy (Björk) que emprega a escala frígia.

E quanto à música atonal? Escute a obra do compositor sueco Ingvar Lidholm, intitulada Laudi (para coro misto à capela); da mesma forma também encontraremos música atonal no gênero metal, tanto na Suécia quanto no Brasil. Escute, por exemplo, a música de Meshuggah (da Suécia) ou do grupo Sepultura (do Brasil), empregando o conceito de consciência da gratificação instantânea, que apresenta estratégia de uso de um gancho (hook) da música de apenas sete segundos e o coro de 50 segundos.

Neste sentido, há um verso de uma música de um dos maiores sucessos da banda sueca Roxette que diz: "Não nos aborreça, chegue ao coro".

Ascom/UFPB: Você já esteve no Brasil anteriormente, para um período de cooperação no Estado do Rio de Janeiro, no Instituto Villa-Lobos (Unirio). Qual a diferença entre sua experiência no Rio e agora aqui na UFPB?

Jan Sparby: Até agora, após quatro semanas, minha experiência dentre todas é que os professores parecem estar muito bem organizados na UFPB, em comparação com a UniRio. Quando se trata de planejamento e preparação dentro deste acordo de cooperação acadêmica, acho que é muito estável.

Os alunos da UFPB tendem a respeitar o horário de início das minhas aulas, o que é uma grande diferença, comparando-se com a UniRio, onde chegariam com 15 minutos a uma hora de atraso.

Portanto, ser pontual afeta o ensino de uma maneira positiva. Por outro lado, os alunos do UniRio tendem a ser um pouco mais corajosos em termos de questionar o professor. Mais respeito dos alunos da UFPB em relação ao professor? Eu não saberia dizer. A UniRio oferece um mestrado profissional, incluindo conhecimento em mentalidade empreendedora - e talvez isso permeie o ambiente em sala de aula? No meu curso aqui na UFPB, percebo um grande interesse em empreendedorismo, embora observe que ainda existe pouco conhecimento prévio sobre o tema.

Ascom/UFPB: Como você foi recebido na UFPB?

Jan Sparby: Meu contato nesta parceria, o professor Felipe Avellar de Aquino, me oferece total atenção, não importa o que seja. Como mencionei acima, os preparativos e o planejamento estão indo muito bem.

Os colegas professores Anderson Mariano, Rainer Câmara, Sandra Aquino e José Henrique Martins têm me apoiado em diferentes aspectos acadêmicos, o que facilita meu ensino. Também fui apresentado a vários docentes e gestores, etc. Fui apresentado à música folclórica da Paraíba. Ouvi os gêneros de música nordestina, Frevo e Forró, se bem entendi.

Anderson Mariano me disse que existem várias variações do Forró como "Baião", "Xote", "Quadrilha", "Xaxado", e ele me envia links para ouvir. Agradeço muito! Com certeza, é interessante e importante conectar-se à herança musical; e aqui estão dois exemplos de música folclórica sueca: Hårgalåten, realizado por Westilings spelmän; Visa från Utanmyra interpretado por Jan Johansson.

No geral, estou convencido de que juntos podemos contribuir para fortalecer a cooperação acadêmica em prol de um aprendizado mútuo entre nossas instituições.

Ascom/UFPB: Você tem alguma avaliação da formação atual do músico brasileiro?

Jan Sparby: No momento, ainda não o cobri. Existem algumas reuniões planejadas no futuro próximo e vou aprender e saber mais. No entanto, parece que o Programa de Performance Musical em Örebro difere da UFPB em termos de estrutura.

Em Örebro, trabalhamos muito em módulos, que visam combinar vários assuntos/temáticas, ou seja, o estudo da harmonia, das estruturas e das formas anda lado a lado, tocando Bartok, por exemplo, compondo canções.

Ascom/UFPB: Entre os temas que ensina, aparece, além da teoria musical e composição, a ideia de gestão de conjuntos e empreendedorismo. Como essas atividades dialogam entre si? Quer dizer: como um compositor pode conciliar a criatividade e o domínio da teoria com a capacidade empreendedora?

Jan Sparby: Os compositores são acostumados a usar sua criatividade, mas se usássemos a perspectiva empreendedora, seria dominar o pensamento divergente e convergente.

Você costuma dividir os dois em: empático versus analítico, ideias versus fatos, artes e humanidades versus ciência e tecnologia, como também criar escolhas versus fazer escolhas.

Gestão, economia, marketing e administração de negócios são outros recursos importantes no empreendedorismo, mas, a meu ver, é mais importante estudar a mentalidade empreendedora e a inovação antes de entrar nas áreas de negócios.

A maioria das pessoas pode iniciar um negócio, mas poucas podem administrá-lo e isso ocorre porque não possuem habilidades empreendedoras. Esteja você planejando iniciar um negócio ou não, compositores e artistas podem se beneficiar do estudo sobre mindset e inovações empresariais.

Costumo receber essa pergunta dos meus alunos: Posso também ser um empreendedor? Minha resposta é sim. Há muitas perguntas que você deve se fazer: Você se atreve a pensar de novas maneiras e a encontrar seu próprio caminho para o sucesso? Você está pronto para também enfrentar a adversidade?

Sua abordagem empreendedora é a chave para alcançar seus objetivos e lidar com os desafios que surgem no caminho. Consiste em como você está preparado. Um exemplo da mentalidade empreendedora é desenvolver uma mentalidade de crescimento. Uma pessoa com uma mentalidade de crescimento é aquela que acredita que é possível ficar mais inteligente com o tempo, através do trabalho duro, treinando o aprendizado, melhorando.

Como alguém, na condição de estudante, tira proveito ao usar esse tipo de mentalidade? Então, é claro, para alcançar seus objetivos, é necessário que seja produtivo; usar métodos diferentes para concluir tarefas e saber escolher. Tem a ver com o uso de diferentes estratégias de trabalho, sabendo quando você deve executar determinadas tarefas e ser capaz de se empenhar a fazer o trabalho.

Ascom | Marcus Alves com tradução do professor Felipe Avellar de Aquino